Contraventor, preso desde fevereiro, é acusado de chefiar quadrilha de jogos ilegais e de envolver políticos em suas negociatas
O Congresso Nacional cria nesta quinta-feira, 19, uma CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) para apurar as supostas ligações do contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira [foto], com políticos e servidores públicos. Cachoeira foi preso em 29 de fevereiro pela Polícia Federal (PF) durante a Operação Monte Carlo, acusado de comandar uma rede de jogos ilegais que operava máquinas de caça-níqueis.
Na operação da PF, foram expedidos 82 mandados judiciais, sendo 37 mandados de busca e apreensão, além de 35 mandados de prisão e de 10 ordens de condução coercitiva em cinco Estados.
Carlinhos Cachoeira ficou conhecido por ser o protagonista do primeiro escândalo político que marcou o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Na época, a crise foi aberta pela divulgação de uma gravação em que o então subchefe da Casa Civil para Assuntos Parlamentares, Waldomiro Diniz, negocia com Cachoeira o recebimento de dinheiro do jogo do bicho. Waldomiro era homem de confiança do ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu.
O dinheiro iria reforçar o caixa dois das campanhas de Rosinha Garotinho e Benedita da Silva ao governo do Rio de Janeiro. Bispo Rodrigues, então deputado federal, foi afastado da Igreja Universal por também aparecer como beneficiário do esquema.
Suspeito de vários crimes, entre eles lavagem de dinheiro e corrupção ativa e passiva, Cachoeira, segundo interceptações telefônicas feitas pela PF, tinhaligações com diversos políticos de Goiás, entre eles o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) [foto].
Demóstenes é acusado de usar seu mandato em favor de Cachoeira e foi flagrado em cerca de 300 telefonemas com o contraventor. Em um deles, ele teria tratado com o empresário sobre uma ajuda em processo judicial e em projeto de legalização de jogos de azar em tramitação no Congresso.
Em relatório, o Ministério Público aponta que Demóstenes foi um dos políticos que recebeu, do grupo comandado por Cachoeira, telefones habilitados nos Estados Unidos – supostamente para tentar driblar os grampos. Ele também teria ganhado um fogão e uma geladeira do bicheiro e pedido dinheiro ao empresário para bancar uma viagem de táxi aéreo no valor de R$ 3 mil.
Em meio à crise, Demóstenes entregou a liderança do DEM no Senado e, para evitar a expulsão da legenda, pediu sua desfiliação do partido. Ele enfrenta, atualmente, um processo no Conselho de Ética no Senado, pedido pelo PSOL, para analisar se o senador quebrou com o decoro parlamentar. O resultado pode levar à cassação de seu mandato.
Além de Demóstenes, outros integrantes do Congresso Nacional, como os deputados Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO), Sandes Júnior (PP-GO), Jovair Arantes (PTB-GO), Stepan Nercessian (PPS-RJ) e Rubens Otoni (PT-GO) foram apontados pela Operação Monte Carlo como supostos envolvidos com Carlinhos Cachoeira.
As investigações da Polícia Federal revelaram que Cachoeira influenciava a nomeação de cargos públicos em Goiás. O governador Marconi Perillo (PSDB-GO) viu a sua situação se complicar quando sua secretária de gabinete, Eliane Gonçalves Pinheiro, e o ex-presidente do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), Edivaldo Cardoso, foram citados nas investigações da PF. Ao iG, Perillo admitiu que já conversou com Cachoeira, mas afirma que foi apenas uma vez e para tratar de incentivos fiscais. Ele negou que Goiás tenha envolvimento com qualquer tipo de contravenção.
A Operação Monte Carlo também levantou suspeitas contra outro governador. Agnelo Queiroz (PT-DF) teria pedido um encontro com Cachoeira. O petista é citado como “zero um” nas gravações e os negócios no DF envolveriam pagamentos de Agnelo a empresas do esquema, como a Delta Construções, e nomeações para cargos da administração. A Delta, presidida pelo empresário Fernando Cavendish, nega irregularidades. A construtora se tornou a principal empreiteira do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) com contratos milionários com o governo federal.
O chefe de gabinete de Agnelo, Cláudio Monteiro, pediu demissão após o Jornal Nacional, da TV Globo, mostrar gravações nas quais ele é citado por dois supostos integrantes do grupo de Cachoeira. Em um primeiro momento, Agnelo negou que teria pedido um encontro com Cachoeira, dizendo que “zero um” poderia ser o papa. Depois, por meio de seu porta-voz, reconheceu que esteve uma vez com o bicheiro.
Quem é quem no caso Cachoeira
Idalberto de Araújo – O sargento aposentado, conhecido pelo apelido de Dadá, é um dos maiores interlocutores de Cachoeira. Encarregado de cooptar policiais e agentes públicos e de obter dados sigilosos para beneficiar a quadrilha de jogos ilegais. Está preso desde fevereiro.
Demóstenes Torres – O senador é acusado de utilizar seu mandato para beneficiar Carlinhos Cachoeira, fazendo negociatas em troca de informações relevantes sobre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Demóstenes pediudesfiliação do seu partido, o DEM, e agora corre o risco de perder seu mandato.
Stepan Nercessian – Deputado [na foto, ao lado do também deputado Rubens Otoni] recebeu R$ 179 mil de Carlinhos Cachoeira, de quem disse ser amigo há 19 anos. Ele afirmou que desconhece as atividades ilegais de Cachoeira e explicou ter tomado o “dinheiro emprestado de emergência”, mas que o mesmo já teria sido devolvido. Nercessian se licenciou do seu partido, o PPS, e pediu investigação contra si próprio.
Edivaldo Cardoso – Ex-presidente do Departamento de Trânsito em Goiás (Detran-GO) foi apontado como lobista dentro do governo do Estado em favor de Carlinhos Cachoeira.
Eliane Pinheiro – Ex-chefe de gabinete do governador de Goiás, Marconi Perillo, pediu exoneração do cargo após ser flagrada em conversas telefônicas com o bicheiro, falando sobre operações da PF no Estado. Ela, que nega as acusações, teria ganhado um aparelho telefônico de Cachoeira. O governador goiano diz não saber das relações de Eliane com o contraventor.
Cláudio Monteiro – Ex-chefe de gabinete do governador do DF, Agnelo Queiroz, pediu demissão após a revelação de gravações nas quais seu nome é citado por dois supostos integrantes do grupo de Cachoeira.
Cairo de Freitas – Ex-assessor do prefeito de Goiânia, Paulo Garcia (PT), mediou encontro entre vereadores, com a presença de Carlinhos Cachoeira, para discutir a liberação das obras do Parque Mutirama, questionada na Justiça pelo PSOL, por indícios de superfaturamento na compra de brinquedos.
Antônio Carlos da Silva – Cabo da PM, articulou operação policial que resultou no fechamento do bingo de Washington Queiroga, integrante da organização criminosa de Cachoeira, que abriu a casa sem a autorização do bicheiro. Foi preso na Operação Monte Carlo.
Marcelo Zegaib Mauad, o “Turco” – Ex-delegado da PM de Valparaíso, também integrante do grupo de Cachoeira, recebia propina para agir em favor da quadrilha de Cachoeira. Foi preso na Operação Monte Carlo
Carlos Antônio Elias – Coronel da PM teria promovido agentes da corporação por ordens da organização criminosa comandada por Cachoeira. Ele nega qualquer envolvimento e diz desconhecer as conversas telefônicas interceptadas pela investigação.
Antonil Ferreira dos Santos – Capitão da PM, é apontado como um dos agentes responsáveis pela segurança de cassinos em Valparaíso e pelo fechamento de bingos concorrentes após ordens do grupo de Cachoeira. Ele teria sidopromovido mediante exigências do grupo do bicheiro.
Carlos Alberto Leréia – Segundo grampos da PF, deputado do PSDB [foto] negociava com o grupo de Cachoeira e teria recebido depósitos bancários e bens obtidos com atividades ilegais. Ele também usava um aparelho celular habilitado pelo bicheiro.
José Olímpio Queiroga Neto – Denunciado pela PF, o empresário integra a quadrilha desde 2004 e era responsável por abrir, fechar e transferir pontos de jogos para outros locais. É acusado de usar suas empresas e de seus filhos para movimentar dinheiro da organização.
Sandes Júnior – Deputado do PP surgiu nas interceptações da Polícia Federal tratando sobre editais de concorrência com Cachoeira.
Jovair Arantes – Líder do PTB na Câmara, é acusado de ter pedido dinheiro a Cachoeira para alimentar os cofres de sua campanha.
Rubens Otoni – De acordo com imagens gravadas em vídeo, deputado do PT de Goiás pediu R$ 100 mil para Cachoeira que seriam utilizados em sua campanha eleitoral.
(*) Com informação iG
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