No ano
passado, partidos políticos firmaram Termo de Compromisso com o TSE se
comprometendo a manter o ambiente de higidez informacional
Por
Felipe Cardoso Araújo Neiva (*)
No
último dia 17 de maio de 2019, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) encerrou o
Seminário Internacional Fake News e Eleições, após intenso ciclo de debates
sobre o combate à desinformação e preservação da liberdade de expressão, entre
outros temas, os quais são de suma importância para manter o ambiente de
higidez informacional nas Eleições.
Um dos
principais focos que levaram à internacionalização do tema está na “Joint
Declaration on Freedom of Expression and ‘Fake News’, Disinformation and
Propaganda[1]”, assinada por várias entidades internacionais em 2017.
Uma das suas cláusulas prevê que “agentes estatais não devem criar, patrocinar,
encorajar ou ainda disseminar informações dos quais sabem ou, pelo bom senso,
deveriam saber que são falsas (desinformação) ou demonstrar um desrespeito, de
forma imprudente, por informações verificáveis (propaganda)”.
Além
disso, os partidos políticos firmaram Termo de Compromisso[2] com o Tribunal Superior Eleitoral, no dia 05 de junho
do ano passado, se comprometendo “a manter o ambiente de higidez informacional,
de sorte a reprovar qualquer prática ou expediente referente à utilização de conteúdo
falso no próximo pleito,
atuando como agentes colaboradores contra a disseminação de fake news nas Eleições 2018”.
Nas
palavras de Rogério Galloro, assessor especial da Presidência do TSE, “o
seminário objetivou, assim, buscar formas de impedir e/ou minimizar a
divulgação de notícias falsas nas Eleições Municipais de 2020[3]”. Essa afirmação demonstra a preocupação da Justiça
Eleitoral com o potencial que as fake news podem demonstrar nos próximos
pleitos.
Todavia,
o que são Fake News?
Para o
ALLCOTT e GENTZKOW[4], as Fake News “são artigos de notícias que são intencional e verificadamente
falsos, capazes de induzir em erro os leitores”. Nas palavras de FRIAS FILHO[5], o mesmo assim conceitua:
“O
termo fake News deveria ser compreendido como toda informação que, sendo de
modo comprovável falsa, seja capaz de prejudicar terceiros e tenha sido forjada
e/ou posta em circulação por negligência ou má-fé, neste caso, com vistas ao
lucro fácil ou à manipulação política”.
Ainda
podemos destacar o entendimento de BRAGA[6] sobre o tema:
A
divulgação de notícias falsas ou mentirosas é fenômeno conhecido
internacionalmente como “fake news” e pode ser conceituado como a disseminação, por
qualquer meio de comunicação, de notícias sabidamente falsas com o intuito de
atrair a atenção para desinformar ou obter vantagem política ou econômica.
E
ainda, de acordo com CLAIRE WARDLE e HOSSEIN DERAKHSHAN[7], as Fake News possuem 3 variantes[8], sendo elas: mis-information, dis-information and
mal-information, demonstradas na figura ao lado.
Há
juristas que compreendem que as Fake News configuram o tipo penal eleitoral descrito no artigo 323 do Código
Eleitoral (Lei nº 4.737,
de 15 de julho de 1965), que dispõe que consiste crime “divulgar, na propaganda,
fatos que sabe inverídicos, em relação a partidos ou candidatos e
capazes de exercerem influência perante o eleitorado”.
Também
estaria prevista no artigo 58 da Lei
das Eleicoes (Lei nº. 9.504,
de 30 de setembro de 1997), no que se refere ao Direito de Resposta, ao prever
este direito àqueles atingidos, ainda que de forma indireta, por afirmação
sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.
Contudo,
para a Justiça Eleitoral, “a mensagem, para ser qualificada como sabidamente
inverídica, deve conter inverdade flagrante que não apresente nenhuma
controvérsia[9]”, “é aquele que não demanda investigação, ou seja, deve
ser perceptível de plano[10]”.
Interessante
verificar que o termo em questão possui abrangente definição. Contudo, o que
deve ser realizado é o seu combate, com provas, sob pena de, na prática,
transformar essa defesa “tentativa de consolidação de crenças comuns mediadas
por esse dispositivo simbólico[11]”.
Essa
será a maior dificuldade a ser encontrada pelos agentes participantes das
Eleições de 2020, principalmente pelo fato de se tratar de eleições no âmbito
municipal, que é marcada pela heterogeneidade e dificuldade de medição e
aferimento do alcance das notícias e propagandas realizadas.
Além
disso, em razão da maior proximidade entre os candidatos e seus eleitores, a
disseminação de Fake News impacta: tanto a escolha racional de projetos
e avaliação do histórico de candidatos quanto deturpam os já mencionados traços
dos candidatos – seja a favor ou em detrimento de sua imagem[12].
Sendo
assim, recomenda-se que os candidatos e eleitores em geral evitem a
disseminação de informações descreditadas, mesmo que sem a intenção de
prejudicar algo ou alguém, principalmente pelas mídias sociais, canal de
comunicação que foi de fundamental importância para a definição das últimas
eleições no Brasil.
1) Declaração Conjunta de Liberdade de Expressão, Fake News,
Desinformação e Propaganda (tradução livre). Encontrável em https://www.osce.org/fom/302796?download=true
↑
2) http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/termo-de-compromisso-com-partidos-políticos-contra-notic...
↑
3) Trecho extraído do site: http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2019/Maio/presidente-do-tse-avalia-que-seminario-sobre-f...
↑
4) ALLCOTT, Hunt; GENTZKOW, Matthew. Social media and fake
news in the 2016 election. Journal
of economic perspectives, v. 31, n. 2, p. 211-36, 2017. ↑
5) FRIAS FILHO, Otavio. O que é falso sobre fake news. Revista Usp, n. 116,
p. 39-44, 2018. ↑
6) BRAGA, Renê Morais da Costa. A indústria das fake news e
o discurso de ódio. In: PEREIRA, Rodolfo Viana (Org.). Direitos políticos,
liberdade de expressão e discurso de ódio: volume I. Belo Horizonte: Instituto
para o Desenvolvimento Democrático, 2018. p. 203-220 ↑
7) Information Disorder: Toward an interdisciplinary
framework for research and policy making; C Wardle, H Derakhshan - Council of
Europe report, DGI (2017), 2017, encontrável em https://rm.coe.int/information-disorder-report-november-2017/1680764666;
↑
8) Mis-information ocorre quando a notícia falsa é
compartilhada, mas sem a intenção de prejudicar algo ou alguém;
Dis-information
ocorre quando a notícia falsa é usada, de forma intencional, para prejudicar
algo ou alguém;
Mal-information
ocorre quando informação verídica é compartilhada para causar prejuízos, sendo
que essas informações, em grande parte das vezes, são de caráter sigiloso ou
foram distorcidas. ↑
9) TRE-PR, REPRESENTACAO n 0603452-86.2018.6.16.0000,
ACÓRDÃO n 54355 de 22/10/2018, Relator (a) RICARDO AUGUSTO REIS DE MACEDO,
Publicação: DJ - Diário de justiça, Data 26/10/2018; ↑
10)
TSE - RP n.
0601007-42.2018.6.00.0000, de 30.8.2018, Rel. Min. Sergio Silveira Banhos; ↑
11)
ALZAMORA, G.; ANDRADE,
L. A dinâmica transmídia de fake news conforme a concepção pragmática de
verdade. Matrizes,
v. 13, n. 1, p. 109-131, 30 abr. 2019. ↑
12)
RUEDIGER, M.A. et al.
Bots e o Direito eleitoral brasileiro: eleições 2018. Policy paper 3. Rio de Janeiro:
FGV DAPP, 2019.
(*) Diretor-geral do Instituto de Estudos Avançados em Direito (IEAD) e integrante do Núcleo de Direito Eleitoral do IEAD, sócio-proprietário
do Neiva Advogados Associados
Fonte: JusBrasil
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