Veja como foi a perseguição à juíza e os últimos momentos de Patrícia Acioli antes de ser executadaRio de Janeiro, RJ – Fórum de São Gonçalo, 11 de agosto, pouco depois das 23h. O corredor vazio é iluminado de repente por um raio de luz. Vem da sala onde funciona a 4ª Vara Criminal, ocupada durante 12 anos pela juíza Patrícia Acioli. É ela quem deixa a sala.
A juíza que condenou mais de 60 policiais, e está ameaçada de morte, vai embora sozinha depois do longo dia de trabalho. São as últimas imagens de Patrícia ainda viva. Às 23h13, ela sai da garagem do fórum.
De lá até a casa dela, a juíza percorreu 29 quilômetros – 41 minutos em estradas pouco iluminadas. A polícia refez esse trajeto procurando por câmeras de vigilância. Encontrou sete.
O carro vira à direita, para pegar a estrada para Niterói. E três minutos depois, é filmado em um ponto. Logo depois, a câmera de segurança mostra uma moto, ocupada por dois homens. A juíza chega a uma rodovia e percorre quase 20 quilômetros. Foram 30 minutos até que outras câmerasfilmassem o carro dela. A cena se repete: a mesma moto ainda está fazendo o trajeto seguido por Patrícia Acioli.
Em um determinado momento, é possível ver que o piloto da moto está de tênis branco e calça jeans. Os dois homens usam casacos. A motocicleta é azul. O farol da motocicleta está sempre apagado. A juíza não percebe o perigo, e não se desvia do caminho que costuma fazer. Dois minutos depois, outras câmeras de segurança confirmam a perseguição.
Às 23h48, faltam quatro quilômetros para Patrícia chegar em casa. Este é o ponto fundamental para entender a o plano dos assassinos. Neste ponto, quando escolheu seguir em frente, a juíza mostrou que ia mesmo para sua casa. Era o único itinerário possível. Por isso, os assassinos deixaram de segui-la e foram na frente, para preparar a emboscada.
A câmera instalada em um ônibus mostra que pouco mais adiante a moto já havia ultrapassado o carro da juíza. Às 23h53, os homens da moto entram no condomínio onde Patrícia mora. Logo depois, ela chega. A imagem do carro passando é a última registrada antes do crime. Mas, mesmo assim a polícia conseguiu descobrir onde os assassinos esperavam pela juíza Acioli. E como ela foi morta ainda antes de o portão da casa se abrir.
A investigação policial descobriu marcas de pneu de motocicleta atrás de um dos carros que estavam estacionados na entrada da casa. Quando a juíza se aproximou da garagem, os bandidos surgiram, e o carro foialvejado ainda em movimento. A prova: os primeiros tiros atingiram a porta da motorista da esquerda para a direita. Mas depois, há marcas de tiros que entram pela janela e pela porta em linha reta. Isso porque o carro acabou parando bem ao lado dos atiradores, que descarregaram suas armas.
Os lugares em que as cápsulas foram encontradas no chão comprovam que os disparos foram feitos de muito perto. As cápsulas recolhidas são de três calibres. Para a polícia, isso tem explicação: um dos atiradores teria usado duas armas.
As cápsulas recolhidas são de três calibres: 38, .40, de uso padrão na polícia, e 45, de uso restrito. Munição comprada com dinheiro público.
Patrícia Acioli foi atingida por 21 tiros. A necropsia aponta como causa da morte ferimentos no pescoço e no tronco. Às 23h58 os assassinos da juíza deixam o condomínio.
Todos esses detalhes foram remontados a partir das perícias no carro, no local e no corpo. Mas a polícia foi além e analisou os dados de mais de três milhões de celulares que passaram pela área entre o fórum e a casa da juíza Patrícia Acioli no prazo de um mês. Com isso conseguiu provar não só o envolvimento dos PMs, mas que o crime foi cuidadosamente planejado. Acostumados à impunidade, os três policiais militares tiveram a ousadia de ir pessoalmente à casa da juíza para reconhecer o terreno, exatamente um mês antes do assassinato.
Quem tramou, com tanta certeza de impunidade, a morte da juíza? Por quê? Segundo a polícia a história começa no dia 3 de junho. Diego da Conceição Beliene, de 18 anos, foi morto por PMs em São Gonçalo. O caso foi registrado como auto de resistência – que é quando um suspeito resiste á prisão e enfrenta a polícia.
“Ele não estava armado. Ele tava sem camisa. Ele tava com a identidade no bolso. Onde tava essa arma então?”, questiona a mãe do Diego.
As investigações desfizeram a tese do auto de resistência. E os oito policiais militares envolvidos na morte de Diego passaram a temer que a juíza expedisse um mandado de prisão contra eles. Entre os oito, os três acusados, agora, pela morte da própria juíza.
“Eles sabiam que seriam presos em poucos dias, que estava sendo expedida a ordem de prisão por processo anterior, e aí não teriam mais tempo para a execução da vitima”, conta o delegado. A vítima: a juíza, cuja morte eles já tinham planejado, segundo a polícia.Na foto, os acusados: o tenente Daniel Santos Benitez Lopes e os cabos Jeferson de Araújo Miranda e Sérgio Costa Júnior. [clique para ampliar]
Na investigação da morte de Diego, a polícia vigiava os movimentos dos três. No dia do assassinato da juíza, antenas de empresas de telefonia captaram os sinais dos celulares de Daniel Lopes e Sérgio Costa Júnior no fórum de São Gonçalo.
Só que antes das 23h, os celulares dos policiais foram desligados. E só foram religados quase uma hora depois de a juíza ter sido executada. A partir daí, a polícia começou a rastrear dados dos celulares do PMs nos dias anteriores ao crime.
No dia 11 de julho – exatamente um mês antes do crime – os registros mostram a movimentação deles. Jeferson de Araújo e Sérgio Costa Júnior estavam juntos em Niterói. Eles ligaram para Daniel Lopes, que estava na zona Sul do Rio de Janeiro e foi encontrá-los.
Depois, o sinal dos três celulares aparece na Rua dos Corais, em Piratininga, Niterói. O endereço da juíza. Os trêsacusados, segundo a polícia, ficaram 26 minutos – das 19h43 às 20h09, juntos na pequena rua onde, um mês depois, a juíza foi morta na emboscada.
Muitas dessas informações foram conseguidas porque as antenas de telefonia indicam a localização de todos os celulares ligados, mesmo quando eles não estão fazendo ou recebendo chamadas.
Fórum de São Gonçalo, 11 de agosto, pouco depois das 23h. Quando saiu sozinha no corredor, a juíza tinha acabado de assinar o pedido de prisão preventiva, por envolvimento na morte de Diego, dos três homens agora acusados também pela morte dela. Assinou e se foi, acreditando que a justiça seria feita.
“Está provado que eles são os autores do homicídio. Isso não há dúvida para a polícia que esses três participaram efetivamente da execução da juíza Patrícia Acioli”, afirma o delegado.
Em depoimento, essa semana, Daniel e Jeferson negaram a acusação. Sergio se recusou a falar. A investigação ainda precisa identificar as armas do crime, entre quase 700 recolhidas no batalhão da PM de São Gonçalo.
“O desfecho da investigação não é só para provar as pessoas que estavam na moto, mas para verificar se de fato há outras pessoas envolvidas”, completa o delegado.
(*) Com informação Surgiu, ENE10 e G1
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