Para
entender as pesquisas se a infecção é afetada pelo remédio é preciso saber a
diferença entre analgésicos, antitérmicos e anti-inflamatórios
Legenda 1: Ministro da Saúde francês levantou dúvida sobre o
uso do remédio por pessoas contaminadas pelo Novo Coronavírus. (Foto: Science Photo Library)
Legenda 2:
Muitas dúvidas e questionamentos sobre o uso do medicamento
ibuprofeno surgiram após o ministro da Saúde da França levantar preocupação com
o uso do remédio no combate aos sintomas do Novo Coronavírus (Covid-19) em sua
conta no Twitter.
Nesta semana, gerou ainda mais
questionamentos a notícia de que um porta-voz da Organização Mundial da Saúde
(OMS) disse que a entidade não recomenda o remédio para quem decidir se
automedicar.
"Nós estamos recomendando
paracetamol, não ibuprofeno", disse Christian Lindmeier em uma coletiva de
imprensa em Genebra, na qual alertou que os cientistas ainda estão investigando
a questão.
Essa fala não quer dizer que
haja uma contraindicação formal da OMS para o uso de ibuprofeno no momento, diz
a organização à BBC News Brasil.
]"A Organização Mundial da
Saúde está ciente de preocupações com o uso de remédios anti-inflamatórios
não-esteroides (ibuprofeno, por exemplo) para o tratamento da febre em pessoas
com Covid-19", afirma a entidade, citando o nome oficial da doença
provocada pelo Novo Coronavírus.
"A OMS está reunindo
evidências mais aprofundadas sobre essa questão, mas depois de uma breve
revisão da literatura [científica], não está ciente de dados publicados sobre
esse tópico com base em pesquisas clínicas ou populacionais."
Mas, afinal, de onde surgiu
essa preocupação e quais as evidências científicas sobre a questão?
Investigação
O alerta do ministro francês
no Twitter foi motivado por estudos que ainda estão em andamento e investigam
se anti-inflamatórios (como o ibuprofeno) podem facilitar de alguma forma o
aumento da infecção em uma pessoa contaminada por Coronavírus.
"É importante lembrar que
os estudos estão em andamento e ainda não há uma conclusão científica sobre o
assunto", diz André Bacchi, professor de farmacologia do curso de medicina
da Universidade Federal de Rondonópolis.
Especialistas ouvidos pela BBC
dizem que, por precaução, é melhor dar preferência ao paracetamol ou à dipirona
em caso de febre e suspeita de Covid-19. Mas também é preciso tomar cuidado com
o pânico e jamais abandonar medicamentos prescritos por um médico sem
consultá-lo.
"É importante alertar
contra o pânico, porque as pessoas não podem abandonar medicamentos prescritos
por médicos, nem correr para estocar paracetamol", explica Bacchi.
Ibuprofeno versus Coronavírus
O ibuprofeno é um tipo de
anti-inflamatório leve, que é vendido comercialmente no Brasil sob diversos
nomes, incluindo Advil e Motrin.
Para entender melhor as
pesquisas científicas que estão sendo feitas para investigar se infecção é
afetada pelo remédio, é preciso saber a diferença entre esses três termos:
analgésicos, antitérmicos e anti-inflamatórios.
Analgésicos são remédios para
a dor, enquanto antitérmicos ajudam no combate à febre. Anti-inflamatórios são
remédios que atuam na diminuição de processos inflamatórios no corpo – que são
reações do organismo a uma infecção ou lesão a um tecido. Durante uma
inflamação, o corpo amplia o fluxo de sangue para o local, deixando a região
atingida vermelha e quente.
Como a febre é um dos sintomas
do Novo Coronavírus, analgésicos e antitérmicos podem ser usados para aliviar
os sintomas. No momento, segundo o Ministério da Saúde e a OMS, aliviar os
sintomas e tratar possíveis complicações geradas pelo Covid-19 são as únicas
formas de tratamento para quem está doente – não existe nenhum tipo de remédio
ou vacina que combata o Covid-19 em si.
O ibuprofeno é um anti-inflamatório eve. (Foto: Science Photo Library) |
Em teoria, anti-inflamatórios
também poderiam ser usados para combater os sintomas. No entanto, os
pronunciamentos do porta-voz da OMS e do ministro de Saúde francês aconteceram
depois que um artigo da revista científica Lancet,
sobre o Coronavírus, citou a possibilidade de anti-inflamatórios, incluindo o
ibuprofeno, agravarem a infecção.
"O artigo da Lancet cita
estudos sobre como diversas variedades de Coronavírus parecem usar uma enzima
específica (enzima conversora da angiotensina-2, ou ACE2) que temos no
organismo como forma de entrar nas células", explica Bacchi. "O
artigo fala de suspeitas de que anti-inflamatórios, incluindo o ibuprofeno,
possam aumentar a produção dessa enzima."
Se o corpo tiver mais dessas
enzimas, diz Bacchi, o Coronavírus teria mais facilidade de se alastrar no
organismo de uma pessoa que tenha contato com ele, tornando mais difícil a
recuperação da pessoa.
"No entanto, ainda não há
evidências fortes de que anti-inflamatórios aumentam essa enzima, é uma
suspeita", diz Bacchi.
Bacchi afirma que, embora,
"não existam evidências científicas que possam estabelecer uma contraindicação
formal" aos serviços de saúde, "por via das dúvidas, é melhor evitar
a automedicação com anti-inflamatórios, por precaução."
"No Brasil as pessoas têm
a opção de usar dipirona e paracetamol", diz o médico Leonardo Weissmann,
consultor da Sociedade Brasileira de Infectologista.
"Mas é bom lembrar que
(automedicação) é só para sintomas leves, em caso de dificuldade de respirar é
preciso procurar o médico."
Interrupção do
Tratamento
Bacchi, alerta, no entanto,
que os anti-inflamatórios são essenciais no combate a algumas outras doenças –
como asma e artrite reumatoide, por exemplo – e que quem usa medicamentos
prescritos contra essas doenças não deve deixar de tomá-los.
"Nesse tipo de situação,
os benefícios dos remédios em comparação com possíveis riscos são avaliados
caso a caso pelos médicos, então é importante procurar o médico e aguardar uma
avaliação caso a caso, jamais parando com um remédio prescrito por conta
própria", diz Bacchi.
Além disso, diz o
farmacologista, não é preciso sair correndo para estocar paracetamol ou
dipirona, o que poderia acabar tornando os medicamentos indisponíveis em alguns
locais.
Ministério da Saúde do
Brasil disse na segunda-feira, 16, que não há nenhuma evidência que justifique
a contraindicação formal do medicamento. "Nossa Secretaria de Ciência e
Tecnologia fez revisão bibliográfica e, neste momento, não há nenhum motivo,
nem comprovação cientifica para que haja substituição do ibuprofeno",
afirmou João Gabbardo, secretário executivo do Ministério da Saúde.
Nesta terça-feira, 17, no
entanto, Gabbardo disse que em função das atualizações o "Ministério da
Saúde está fazendo uma avaliação e deve emitir nova nota sobre o uso desse
medicamento" amanhã, quarta-feira, 18.
Fonte: BBC News Brasil
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