Um repositor empurra um carrinho com papel higiênico até uma loja em Málaga. (Foto: Agência EFE) |
Entre os fatores, a
compra compulsiva: pacotes de papel higiênico ocupam grande espaço e o lugar
vazio que deixa leva as pessoas a pensarem que vai esgotar
Assim como o Coronavírus e a economia são globais, o mesmo acontece com o
comportamento humano. Na Espanha, um dos produtos que primeiro desapareceu das
prateleiras dos supermercados foi o papel higiênico. Quando o Governo suspendeu
as aulas nas escolas na semana passada, imediatamente as redes sociais se
encheram de imagens de
clientes lotando compulsivamente os carrinhos. E entre aquelas fotos, se havia algo que chamava a atenção
era o aprovisionamento de volumosos rolos de papel higiênico. A Espanha não é o
único país em que isso aconteceu. Em Hong Kong o produto também escasseou, como
nos Estados Unidos, no Reino Unido, em Cingapura ou na Austrália. A procura
também é grande nos supermercados brasileiros.
Entre os motivos alegados por David Coral, presidente da agência BBDO, está o fator psicológico, pois, ser um produto higiênico dá
uma sensação de segurança. Mas ele também acrescenta que tudo tem a ver com um
conceito que nasceu com os telefones celulares, o FOMO (acrônimo de fear of missing out), ou seja, o medo
de perder alguma coisa, de ficar de fora, naquele caso, do mundo tecnológico.
E, neste caso, “medo do que
acontecerá se eu não tiver o que os outros têm. Neste caso, o papel
higiênico, porque se você vê que as pessoas estão comprando, pensa que é por
alguma razão e que é necessário, e nesse tipo de comportamento se demonstra que
somos gregários”, explica Coral.
O professor de marketing da ESIC, Paco Lorente, também fala sobre comportamento, esclarecendo
que todo esse fenômeno está relacionado à psicologia aplicada ao marketing. “Os
momentos de estresse fazem que uma compra tenha um componente mais
emocional do que racional, quando em uma situação normal existe um equilíbrio entre os
dois elementos”, diz o professor, que relaciona a alta demanda por papel
higiênico ao fato de que o consumidor, diante da possível escassez de um
determinado produto, decide acumular a maior quantidade possível. “Em uma crise
como a que estamos vivendo, os produtos que nos dão bem-estar e limpeza são os
mais valorizados”, acrescenta o professor.
No entanto, existe outro fator que determina essa compra
compulsiva: a prateleira vazia. “Os pacotes de papel higiênico, devido ao seu
volume, ocupam um grande espaço dentro de um supermercado, portanto, não há
muitas unidades expostas, o que faz com que esgotem rapidamente. O lugar vazio
que deixa leva as pessoas a pensarem que vai escassear e isso provoca
ansiedade, além do fato de que o que o consumidor mais quer é controlar a
situação”, explica Lorente. Na opinião deste especialista, tal sentimento de
escassez, e os estrategistas de marketing bem o sabem, é o que desencadeia a
euforia. Foi o que aconteceu, lembra, com o lançamento das bonecas Monster
High. Elas foram estrelas de uma campanha publicitária de Natal, que se tornou
um sucesso, uma vez que poucas unidades foram colocadas à venda e isso produziu uma
grande expectativa, porque esgotaram imediatamente. “E fez delas um objeto de
desejo”, diz o professor da ESIC.
Também o diretor acadêmico do
Master in Market Research and Consumer Behavior da IE Business School, Jaime Veiga,
justifica a situação falando de comportamentos irracionais gerados pelo
estresse e pelo medo. “Uma situação de confinamento a longo prazo gera dúvidas
sobre quanto vou precisar, mas gera, principalmente, medo que o produto acabe”,
explica. E concorda com os outros especialistas consultados que o efeito da
histeria coletiva costuma acontecer quando um artigo é escasso. “Quando há
muitas latas de conserva em uma prateleira, isso não gera ansiedade, mas se
está faltando, uma necessidade urgente de consegui-las se produz”, explica
Veiga, que acredita que a amplificação de tudo isso teve a contribuição das
redes sociais, que reproduziram imagens que incitavam ao consumo desenfreado.
A escassez de um produto, a
menos que obedeça a uma estratégia de marketing ou como acontece no setor do
luxo, no qual são lançadas edições limitadas para aumentar a percepção de
exclusividade de um artigo, é algo a que não estávamos acostumados no primeiro
mundo, diz o presidente da BBDO. “Essa ansiedade de ter o que outro comprou, e
ainda mais agora, é algo humano”, afirma Caro, que forma parte da Associação de Criatividade Transformadora
e envia uma mensagem para promover o consumo responsável e não ficar sem
estoque.
Fonte: El País
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